quinta-feira, 30 de julho de 2015

APRENDENDO UMA LÍNGUA

Juan, meu marido, começou uma atividade maravilhosa: todos os sábados dá uma aula de espanhol para o Igor, neto da minha caseira Vanda, que tem 7 anos. Com apenas três aulas,Igor já sabe os números, os meses, as cores. Já canta uma música linda e faz pequenas frases . Ele se esforça bastante para falar com um belo acento. Quando termina alguma atividade ele dá pulos de alegria. Juan lhe perguntou qual era o dia da semana mais feliz para ele e sem pestanejar respondeu que era o sábado. Juan perguntou o motivo e ele disse que era porque tinha aula de espanhol! Eu perguntei se ele já havia contado no colégio a novidade e ele disse que sim, mas que ninguém acreditou. Nem a professora. Parece que aprender uma língua é algo do outro mundo. As crianças amam aprender uma língua. E por que as escolas não ensinam? Com a facilidade com que aprendem! Fica registrado o meu protesto veemente. Uma nova língua é um tesouro. Mas para isso é preciso investimento. Existem os genocídios visíveis. Mas existem os genocídios invisíveis. Quando num país se rouba como no Brasil, quantos talentos são assassinados? Quantas pessoas são assassinadas por falta de atendimento médico, por falta de hospitais, por falta de remédios? Quando os recursos são roubados e não se investe em saneamento a morte está sendo semeada. Quando o meio ambiente é degradado, rios poluídos e mares e baías, com a morte de tantas vidas, isso é assassinato. Quando os recursos são roubados e não se investe na infância, na cultura, na educação, aumentando e alimentando a roda gigante da violência, quantos assassinatos. No Brasil , com toda a drenagem dos recursos públicos que seriam investidos e não são, assistimos estupefatos a um genocídio invisível.A destruição sistemática de milhares de vidas ceifadas por falta de investimento.

quarta-feira, 29 de julho de 2015

O FILHO ETERNO

Alguns livros chegam com alguns anos de atraso, mas ainda bem que chegam! É o caso do livro O Filho Eterno do Cristóvão Tezza. Foi muito recomendado mas eu não o havia lido. Não havia lido nenhum livro dele. Como vou viajar com o Cristóvão num projeto do Governo de São Paulo, comprei o livro. E fiquei impactada, emocionadíssima, engasgada. Cristóvão se desnuda de uma maneira impressionante e fala dos sentimentos obscuros, aqueles sentimentos e pensamentos terríveis que escondemos debaixo de sete colchões. A partir do nascimento do seu filho Felipe, com Síndrome de Down, ele traça a estrada inteira da sua vida, das suas vivências, dos seus fracassos, medos, fragilidades, ambições, vaidades. Agora só me resta comprar seus outros livros. Alguns livros que amo me chegaram de uma maneira inesperada. Na Feira de Brasília, parei numa livraria e a mulher olhou para mim e me disse: "Não vá embora, tenho um livro para você. E voltou com o livro As Brasas do Sandor Marai que amo de paixão perdida e já li três vezes e depois comprei vários outros livros seus. Mas para mim As Brasas é único. Como ela podia saber? Monica Botkay, minha amiga tão antiga, quando eu tinha 23 anos me emprestou La Vie Devant Soi, do Émile Ajar, pseudônimo do Romain Gary. Enlouqueci. É um dos livros da minha vida. É perfeito. Nunca mais nos separamos.Tive que devolver o livro naquela época. Mas na única vez em que fui a Paris, no meu primeiro dia fui procurá-lo num sebo na beira do Sena e foi o primeiro livro que vi. Walder, meu amigo onde estava hospedada, ao sair do trabalho também foi procurá-lo para mim sem saber que eu já o havia encontrado. E me trouxe uma outra edição. E uma vez , ouvindo o Bartolomeu Campos Queiróz falando em algum evento, de repente ele disse: "todo mundo tinha que ler La Vie Devant Soi". Pronto. Fui fulminada por um raio. Ao sair falei com ele, mas Bartolomeu, esse é um dos livros da minha vida! Ele fez um carinho no meu sapato e sorriu. Agora, por causa do meu amigo Cristiano Mota Mendes estou viajando com Riobaldo e Diadorim, relendo o Grande Sertão: Veredas. Nos falamos por whatsup várias vezes ao dia para discutir o livro, o trecho onde estou. Recebi ontem por correio A Lebre de Vaatanen de Arto Vaasilina, autor finlandês. É uma tradução portuguesa. O livro é delicioso e li em francês na casa da Monica Botkay. Depois já li mais dois livros dele. Ele fala de coisas sérias e densas com um humor maravilhoso. A gente sapateia de rir. Havia indicado o livro para o Clube de Leitura, mas quase ninguém conseguiu comprar, então desistimos.Agora já estou relendo, intercalando. Quando parece que vou explodir de emoção com o Guimarães Rosa passo para ele. Essas são as minhas veredas. Os livros.

terça-feira, 28 de julho de 2015

O DIA

O dia está escuro, carregado, suas nuvens pesadas de água. Sempre gostei de dias assim cinzentos. Como se houvesse dentro do corpo um ninho onde um pássaro tece seu canto que é feito de uma certa melancolia. E nos dias assim, com novelos de bruma, eu vejo o pássaro. Cada dia tem a sua tessitura, não sabemos ainda que alfabeto nos trará. Hoje recebo amigos que moram em Israel. São pacifistas, pró um Estado Palestino, mas a voz da paz não se faz ouvir. Se houver paz os Senhores das Armas não terão trabalho. Eles são os ajudantes da morte e ninguém sabe como podem dormir, comer, caminhar, com tantos assassinatos , com tanto sangue nas solas dos sapatos. Mas eu acredito na paz. E não estou sozinha. A poesia é o que tenho para oferecer. E pão, que eu mesma faço.E o meu amor imenso por tudo o que é vida. Sexta-feira recebo um grupo de 20 adolescentes. São jovens ávidos por livros. Flavia Lins trabalha leitura com eles, numa ONG que cuida da saúde de seus irmãos doentes. Então mostrarei a eles o jardim luxuriante atrás da casa, onde antes só havia areia. O milagre da vida. Basta uma semente e um pouco de água. E cuidado. Mostrarei meus livros, vamos ler juntos os meus poemas. O esboço da manhã do nosso encontro já dança no ar, como roupas coloridas num varal.

segunda-feira, 27 de julho de 2015

DORES OBSCURAS

Martha Medeiros escreveu um belo artigo ontem, na Revista de Domingo do Jornal O Globo, sobre sentimentos inomináveis, dores obscuras, para os quais não existem palavras. Todos nós, humanos, somos capazes de fazer uma lista destes sentimentos. Quando criança e até muito tarde eu tinha um sentimento horrível de não pertencimento. De repente a dor do outro entra dentro de mim de uma tal maneira que não posso suportar. Às vezes a emoção de alguma vivência é tão grande que o corpo quase não aguenta, o corpo fica pequeno para aguentar tal emoção. Ela descreve as suas vivências, diferentes das minhas e das tuas para falar do trabalho de um americano que está no youtube e se chama John Koenig, que fez uma série c hamada "Dicionário das dores obscuras". A ideia é maravilhosa. E ela termina dizendo : "A poesia é o verdadeiro dicionário das dores obscuras".

domingo, 26 de julho de 2015

DONA CONCEIÇÃO

Dona Conceição tem 96 anos. Mora sozinha em São João Del Rey. Hoje, domingo, dia 26 de julho de 2015, Dona Conceição está deixando sua cidade para trás, suas raízes, seus parentes, amigos, vizinhos, está mudando de vida. Tem sonhos, novos planos.
Ela é a mãe da Vanda, nossa caseira e decidiu comprar uma casinha aqui em Saquarema. Comprou uma casinha na Barreira, um bairro ainda rural, inacabada e já vem vindo, entusiasmadíssima , de malas e cuias, para terminar a casa e se instalar. A mudança veio antes. Ela planeja o que vai fazer, as cores dos cômodos, a cor da casa. Vai continuar morando sozinha, mas quer ficar perto da filha e dos netos e bisnetos nos próximos anos.
Então acho que a Dona Conceição nos dá uma grande aula. Uma aula de vida. Podemos sonhar e mudar tudo até o último minuto!
Enquanto escrevo ela está na estrada. De São João Del Rey até Saquarema são oito horas de viagem!
Ela é bem bonita, mestiça, toda elegante, como se diz na roça, sacudida! Ainda cozinha muito bem e espero que me faça uma broa de milho assada na folha da bananeira na inauguração da casa.

sábado, 25 de julho de 2015

UM PASSEIO

Hoje fomos caminhando até a Feirinha perto da Vila pelas margens do aeroporto para comprar tapioca. O aeroporto daqui de Saquarema não tem pista, é só gramado. Ali, na beira do aeroporto as casinhas ainda são do tempo em que a cidade era um vilarejo de pescadores. São casinhas de pescadores, miudinhas, singelas.
O brasileiro se vira. Cada um como pode. Passo na porta de uma casa e um cartaz diz: "Explicadora formada".
Numa outra casa: "Vende-se sacolés"
E em cinco casas vejo um barzinho na calçada com mesas e cadeiras toscas. Uma improvisação. Num desses estabelecimentos, a janela estava aberta  e havia um balcão com algumas garrafas e imagens de Nossa Senhora.
Dá uma ternura. Uma vontade de chorar como na música do Chico. É gente simples e que faz o que pode para sobreviver.
Na barraca da tapioca se pode comer tapioca feita na hora e também pastéis, caldo de cana, bolinhos de aipim.
Há uma outra barraca que faz churrasquinho com farofa.
Amo as feiras. Viro criança num segundo e me vejo lá longe, na minha infância, com a Eunice, minha mãe negra, comendo quebra-queixo, que me levava direto para Pasárgada sem eu saber que Pasárgada existia.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

SUPERAÇÃO

Em agosto o médico que operou a minha coluna me dará alta. Seis meses depois da cirurgia. Ainda não pude voltar para o Pilates, só em agosto.
Mas já consegui um ritmo. Estou caminhando 40 minutos todos os dias. Eu e Juan andamos pelas ruas de dentro. São belas, calmas.
É uma conquista tão impressionante que às vezes nem acredito. Antes da cirurgia não podia ir nem até a esquina.
Sou disciplinada. A caminhada é sagrada. E me dá uma dose de bem estar tão grande que fico eufórica.
Faço meditação. É tão difícil meditar. Mas a meditação é o que me dá a fortuna de estar centrada. A meditação me dá de presente o presente! Viver intensamente o que se faz no momento em que se faz. É magnífico. Fazer meditação todos os dias, caminhar, aprender uma língua nova. Tudo isso requer um esforço. Mas o resultado dentro da gente surpreende.
Ontem alguém me perguntou: qual é o seu lazer? Bom, não posso dizer que a leitura seja um lazer. Ler para mim é respirar. Então acho que tudo o que faço é lazer, porque viver para mim é lazer. Já quase morri algumas vezes, então estar viva é impressionante.
Mesmo quando estou fazendo uma tarefa aborrecida, tento colocar algo bom, algum prêmio.
Enquanto escrevo penso: descobriram um planeta gêmeo da Terra, tão longe. tão longe, mas o pensamento o alcança, em toda a sua maravilha.

PARA VER O MUNDO

Para ver o mundo
há que afiar os olhos
com a luz do sol
e da lua
e nos lume dos olhos
do outro.

Então as cores acordam
como flores raras
e pequenas felicidades
(ou sofrimentos)
esvoaçam pela superfície do dia

in Cinco Sentidos e Outros (Lê editora).

quinta-feira, 23 de julho de 2015

SIGNIFICADO

Ontem escrevi uma carta para uma sobrinha espanhola. Ela me perguntava em sua carta o que tenho feito e eu respondia:
Alimento meu Clube de Leitura com belos pensamentos constantes, (amo cada um dos participantes) e com livros.  Nos encontramos de dois em dois meses e no último encontro, Gil, que antes não era leitora, nem sabia como expressar a vastidão do mundo que se abriu para ela.
Recebo escolas públicas aqui em casa para um café da manhã ou almoço comigo.O encontro e feito de várias vivências maravilhosas.
Recebo professores para lhes dar uma pitada da minha loucura.
E me envolvi agora com a construção de uma escola em Burkina Faso, África, numa aldeia paupérrima e perdida que jamais visitarei, pois não tenho condições físicas para isso.
A escola que será construída arrebatou meu coração, pois os habitantes da aldeia não pedem nada e falta tudo. Mas eles querem uma escola para os pequenininhos, uma escola de ALVENARIA e não de palha e barro como suas casas. Eles querem que a escola dure para sempre.
Monique Malfatto entrou na minha casa pelas mãos da Monica Botkay no dia em que recebia uma escola de Duque de Caxias. Ela vive três meses na África com eles e o resto do tempo entre França e Itália para conseguir doações. Esta será a terceira escola de uma aldeia de 600 habitantes. A primeira era muito pequena. A segunda já era maior e cabia bastante gente. E agora a terceira que ajudaremos a construir será para o maternal.
Quando a escola fica pronta o Estado assume , mandando os professores. É a primeira geração que saberá ler e escrever. As escolas são bilíngues. Aprendem na sua língua e em francês.
Quando acabei de escrever a carta, eu me perguntei: o que significa tudo isso? Acho tão pouco tudo o que faço, às vezes.
Mas tudo isso "me significa", me dá sentido, me mantém viva e pulsante.
Aplico na minha vida diária o conceito africano de UBUNTU. Eu sou eu mas também sou você.
Estou fazendo uma campanha no facebook para quem quiser me ajudar. Você pode entrar em contato comigo.
Minha irmã Evelyn Kligerman e meu cunhado Luis farão juntos uma placa de cerâmica para embutir na parede da escola. E já sei o que quero escrever:

Une école pour toujours               Uma escola para sempre
Comme un puits                           Como um poço
Les amis brésiliens sont ici.          Os amigos brasileiros estão aqui.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

O VENTO

Ontem veio o vento. De repente entrou cantando num redemoinho, varreu a varanda, encheu a varanda de folhas, virou o mar do lado do avesso, trouxe a chuva.
Em nosso encontro de sábado , do Clube de Leitura, Ronaldo cantou um poema do Manuel Bandeira que amo de verdade. Aliás amo tudo o que ele escreveu. É um dos poetas da minha vida:

CANÇÃO DO VENTO E DA MINHA VIDA

O vento varria as folhas,
O vento varria os frutos,
O vento varria as flores...
   E a minha vida ficava
   Cada vez mais cheia
   De frutos, de flores, de folhas.

O vento varria as luzes
O vento varria as músicas,
O vento varria os aromas...
   E a minha ida ficava
   Cada vez mais cheia
   De aromas, de estrelas, de cânticos.

O vento varria os sonhos
E varria as amizades...
O vento varria as mulheres.
   E a minha vida ficava
   Cada vez mais cheia
   De afetos e de mulheres.

O vento varria os meses
E varria os teus sorrisos...
O vento varria tudo!
   E a minha vida ficava
   Cada vez mais cheia
   De tudo.

Manuel Bandeira

segunda-feira, 20 de julho de 2015

MIGUILIM

Receber Miguilim em nossa casa foi uma experiência única e maravilhosa.
Este encontro do Clube de Leitura da Casa Amarela foi especial pois festejávamos também o aniversário do Juan.
Amigos mais do que amigos chegaram cedo do Rio e a varanda já estava arrumada para o almoço com as mesinhas que alugo cobertas com as lindas toalhas de chitão florido. A varanda fica parecendo um imenso jardim.
Um pão acabava de sair do forno quando chegaram Messias , Kátia e Monique. Fizemos um botequinzinho com café e pão quente com queijo. E logo chegaram Cristiano, Ana e Ronaldo com seu violão para as muitas surpresas. O botequim foi crescendo. Chegaram Norma Estrela e Dirceu. Chegaram César e Fátima.
E finalmente chegaram  Hélio e Fernando, Chico, Gil.
Entramos, nos sentamos.  Quis começar pelo fim, marcando a nova data e indicando os livros:
Dia 10 de outubro. Judas, do Amoz Oz e A Última escala do Velho Cargueiro do Alvaro Mutis. E li a linda carta da professora Zete.
Cristiano que estuda Guimarães Rosa desde a sua juventude, também fez a proposta de começar pelo fim. Mas eu não resisti e quis falar só um pouquinho do começo, quando Miguilim traz para a sua mãe o grande presente: alguém lhe disse, na sua viagem com Tio Terez, que o Mutum é bonito. E como ele queria levar esta frase de presente para a sua mãe! Assim ela não ficaria mais triste suspirando pelos cantos! E ela nem ligou, aprisionada que estava naquele lugar, naquele triângulo amoroso que Miguilim e seu irmão Dito intuíam.
Mas Cristiano puxou o fio para o fim, para o médico que traz os óculos e  finalmente Miguilim pode ver tudo e finalmente pode ir embora, a promessa que fez lá atrás quando Dito havia lhe ensinado que pagar uma promessa antes do pedido ser realizado é muito bom. Os óculos são o seu ritual de passagem. Messias falou um pouco dos rituais de passagem em algumas culturas.
Chico e César falaram que o livro contava a infância deles.
Messias contou que seu tio tinha uma fazenda onde passava a infância que era perto realmente do Mutum. E que ele havia vivido aquelas maravilhas.
Gil falou que o livro também era a sua infância no interior do Maranhão.
Ronaldo cantou uma música que ele fez para um espetáculo que faz a síntese do livro e fala lindamente do Miguilim não é alegre e não é triste. Nos apaixonamos pela música e
cantamos o refrão.  
Maria Clara leu um poema que fez, lindíssimo, sobre o Miguilim.
Falamos um pouco sobre tudo, a sensibilidade das crianças, o amor entre os irmãos, a morte do Dito, o ritual que a preta velha Mãiitina faz com Miguilim, a sensualidade da mãe, a tragédia da família. Seria Miguilim filho do Tio Terez?
Falamos um pouco de cada personagem.
Todos falaram que ninguém no mundo jamais descreveu a natureza como Guimarães Rosa . Cores, cheiros, animais, sensações.
Todos nós vivemos no Mutum enquanto líamos o livro. E eu confesso que jamais sairei de lá. Assim como passei a minha infância no Sítio do Pica Pau Amarelo, agora vivo para sempre no Mutum, dentro das suas matas. Nas suas veredas.
Juan , que passou a sua infância numa aldeia pobre no interior da Galícia , disse que dentro do livro estava em casa, pois foi aquilo que viveu. E lembrou que antigamente as crianças viviam no mundo real. Tocavam as coisas, viam a vida acontecer e morrer e que hoje vivem no mundo virtual. Ainda não temos distanciamento para saber o que é isso. E também disse que ele descreve um mundo que logo acabará, pois 80% da população já saiu do campo para as cidades
Devo dizer que nunca li e reli nenhum livro mais belo na minha vida. E que se alguém não leu corra para ler pois ninguém pode viver sem Miguilim.
Ana e Ronaldo prepararam uma surpresa para o Juan: cantaram Se Todos fossem iguais a Você, do Vinicius. Ana tem uma voz maravilhosa.
Todos leram poemas do Vinicius e fechamos o encontro cantando Uma Tarde em Itapuã. Coral do grupo!
Vanda preparou a melhor feijoada do mundo. Havia empadão de legumes para quem não come carne.
Cantamos parabéns com violão e tudo. E celebrar a vida e a literatura alimenta a nossa chama de vida.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

CARTA

Ontem recebi uma carta de uma professora, por correio, verdadeiramente impactante.
A carta é muito longa e transcreverei alguns trechos. A professora se chama Eliane.

Curitiba, 09 de julho de 2015

Cara Roseana,

   É com grande expectativa que lhe escrevo novamente, porém desta vez com uma expectativa bem maior
    Sou professora do quarto ano da Rede Municipal de Curitiba. Nossa escola se localiza num bairro de periferia e nossos alunos vivenciam várias situações: violência, drogas, assaltos e com baixo nível de escolaridade das famílias. Atualmente .a comunidade vem recebendo muitas famílias de Alagoas e algumas agora vindas do Haiti.
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   No início do ano letivo , tivemos um encontro pedagógico no Núcleo de Educação do bairro que pertence a nossa Escola CEI Professor Antonio Pietruza. Lá a professora do curso apresentou sugestões de textos de sua autoria a serem trabalhados com os alunos. Salientei naquele momento, que eu já havia programado em trabalhar neste ano novamente alguns textos seus, pois obtive resultados surpreendentes e que na época também lhe escrevi juntamente com meus alunos. Foi uma troca de experiências!
   Como não foi diferente, desenvolvi um projeto englobando Língua Portuguesa e Matemática.
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   No decorrer do projeto vimos como os alunos foram ficando encantados com a leitura dos seus textos. Um belo dia, uns alunos cogitaram a ideia de lhe escrever e muitos riram pois disseram que autores-escritores não tem tempo... Foi aí que comentei que há uns anos atrás uma turma minha também pensava assim, e você provou ser diferente! Não deixou seus leitores "na mão". Lembro hoje como tudo aconteceu...
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   Nesta última semana , me emocionei muito na reunião de pais, com um relato da mãe do João Andrei. Ele é um aluno com muita dificuldade em Língua Portuguesa, tem todo um histórico, faz atendimentos e sala de recurso. Contei à mãe que percebi avanços neste último mês na aprendizagem: já está lendo lentamente e formando pequenos textos, o que não acontecia . A mãe, imediatamente, relatou-me a mudança de comportamento de seu filho, disse-me que vem lendo mais e está pedindo muito a ela que compre um livro da Roseana Murray porque a professora Eliane leva textos legais desta autora. Meus olhos encheram-se de lágrimas de emoção, saber que através de seus textos consegui despertar o interesse de um aluno de quarto ano à leitura e escrita. Isto é gratificante, e você Roseana, é parte desta conquista deste aluno! Bem, se fossemos eu e a professora Rosiméri relatar as nossas experiências ficaríamos um tempão falando...
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Bom, a carta continua . Ela me conta o quanto gostaria de trazer seus alunos para o meu projeto Café, Pão e Poesia, mas é tão longe...E seus alunos me escreveram e me enviaram cópias de seus próprios poemas e também desenhos. Hoje vou ao correio levar a resposta e estou enviando um livro.
Transcrevo trechos desta bela carta para mostrar a força da poesia.
A poesia é terapêutica . A poesia abre estradas dentro do corpo e da alma. A poesia fez com que um aluno ml alfabetizado, com muitos problemas, retomasse a leitura e a escrita.
Obrigada Eliane, por me fortalecer.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

CHEGADA

Cheguei ontem de Visconde de Mauá. Seis horas e meia de viagem, mas acontece que não são essas horas apenas. É a passagem de uma dimensão para outra. Fico muito cansada. Como se tivesse feito uma viagem interplanetária.
Na minha casinha dentro da mata nem o telefone recebe sinal. Sem internet , sem televisão, sem notícias.
Na última manhã, antes de ir embora, enquanto arrumava tudo, um esquilinho gritava na varanda. Estava no limoeiro a um palmo da minha mão. Acho que me dizia adeus.
Aqui estou, na minha mesa, o mar maravilhosamente azul atrás de mim, está tão calmo que nem fala. Rumino as notícias, rumino o mundo.
Mas sábado temos o encontro do nosso Clube de Leitura com a presença de muitos amigos. Nosso Clube já é uma família, fortes laços nos amarram, as cordas sonoras da literatura.
Discutiremos Miguilim do Guimarães Rosa, de uma beleza estonteante.
E sairemos fortalecidos para aguentar o peso do mundo.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

NA MONTANHA

Hoje estou conectada pois vim até o ateliê de cerâmica da minha irmã Evelyn Kligerman e meu cunhado Luis Mérigo. Cada vez que venho a Mauá ela passa um dia comigo na minha casinha e eu desço para passar o dia com ela aqui no Vale do Maringá.
Impossível descrever a minha felicidade todos os dias. Nem tentarei. Como a Bia Hetzel sabe, pois publicou meu livro Diário da Montanha e agora contei para o Cristiano Mota Mendes, e agora conto para todos , eu também sou árvore além de gente (aliás sou muito melhor como árvore do que como gente) e é na montanha. dentro da mata, que posso ser o que sou de verdade, sem medo de mim.
Cada dia é único em sua imensa felicidade. Acendo o fogo bem cedinho e os jacus já estão fazendo a sua primeira reunião, os guaxos gritam suas belas palavras e quando dou sorte vejo esquilos subindo e descendo o primeiro tronco que minha vista alcança.
Meu grande sonho era ver uma onça.
E como a onça do Rosa eu vou andando e falando, bom, bonito, bom, bonito...