segunda-feira, 30 de abril de 2018

PAZ E LITERATURA

Logo no princípio do Dr.Fausto, do Thomas Mann, lemos que nem as religiões podem reprimir as forças arcaicas e destruidoras que habitam o homem. Apenas a literatura pode fazer isso.
Escrevo sentada num Café e não tenho o livro comigo para fazer a citação exata.
Mas é mais ou menos isso.
Sabemos que os regimes totalitários sempre queimaram livros. A própria Igreja Católica tinha o seu índice de livros proibidos. 
Penso que essas forças arcaicas podem sim ser domadas com a literatura, pois é quando nos misturamos com um personagem, assumimos sua vida e suas dores, que aprendemos a compaixão no melhor sentido da palavra e exercitamos a empatia.
Fiquei pensando também no quanto as guerras representavam uma honra e um sacrifício necessário. Penso em como os soldados partiam cantando para matar ou morrer ou as duas coisas. Penso nos heróis de guerra, nas medalhas e em como, ainda bem, ir para a guerra já não representa uma honra para as famílias.
Viver sem utopias é muito difícil. E a paz é quase uma utopia. Não completamente, porque a paz é possível.
Então penso na literatura como um instrumento fazedor de paz.

domingo, 29 de abril de 2018

NOS PRESÍDIOS

Soube pela coluna da Miriam Leitão hoje, que Marco Lucchesi faz o mais maravilhoso trabalho de leitura nos presídios. Algo tão imenso e emocionante que deixa o coração da gente abalado.
Lucchesi nos diz o que é absolutamente óbvio e gritante: Que se não investirmos na criança e numa cultura da paz, os presídios continuarão abarrotados. 
Lucchesi contou que começou a ir aos presídios quando um detento o chamou porque havia conseguido montar uma biblioteca.
O preso disse que a biblioteca era o Olimpo do presídio.
Então chegamos ao princípio de tudo.
O Ensino Fundamental tem que ser extremamente fortalecido e a escola tem que ser um oásis e não uma prisão. Para que as prisões de verdade não continuem se expandindo.
A Sala de Leitura tem que ser o coração da escola. Tudo deve partir daí. E o Professor/a precisam ser reconhecidos e valorizados (e bem pagos), como estrela-guia que são.
O Brasil é um país cruel, injusto. São milhões de talentos desperdiçados. Um holocausto de talentos.
Acredito, é a minha fé, de que com uma escola pública que "ouça" a criança, uma escola com o foco na literatura e na arte, o país estaria em condições de reverter as suas injustiças. Muitas escolas públicas de qualidade existem, mas não é uma política de Estado. Elas teriam que ser a regra e não a excessão.
O trabalho do Marco Lucchesi emociona mais ainda quando sabemos como são as prisões brasileiras. Há que ter muita coragem para entrar nesse inferno.
Eu já o admirava como poeta. Agora, ao saber desse trabalho tão imenso, eu realmente fico sem palavras para dizer o meu agradecimento.

quarta-feira, 25 de abril de 2018

LIVRO NAS MÃOS

Tenho meu livro Poemas para Metrônomo e Vento da Editora Penalux nas mãos.
A emoção é tão imensa que poderia chorar um rio.
Explico porque.
Desde 1980 publico livros para crianças e jovens.
Fui carimbada e o mercado de livros de poemas para adultos é outro.
Leo Cunha já disse que coloco todo o talento que tenho nos livros infanto juvenis.
Mas escrevo poemas para gente grande também, desde sempre.
Muitos me diziam: Impossível conseguir uma editora.
Mas Salgado Maranhão, o grande poeta, se interessou por mim. E a editora me aceitou.
E o milagre aconteceu.
Milagres sempre acontecem.
Tenho nas mãos um livro belíssimo. Desde a capa, assinada por Silvia Negreiros, a contra capa do Salgado Maranhão e Ferreira Gullar, a orelha, assinada por José Inácio Vieira de Melo, até a qualidade do papel, que parece um pergaminho.
Os poemas falam do que é importante. Vida, amor e morte e o cotidiano no meio, que é o lugar onde se vive.
Dedico o livro aos meus primeiros leitores, aqueles que me dizem isso ou aquilo e o que me dizem realmente importa.
Quando estive com Saramago em Lanzarote, ele disse que nunca esperou tanto da vida. Nem eu.
Nunca esperei ter tantos leitores espalhados pelo país.
Hoje me telefonou Tiana Tapety para me contar o que faz a minha poesia com as crianças de Oeiras. Milhares de crianças lendo os meus poemas. Ela me diz: A tua poesia conduz.
Sei fazer poucas coisas. Mas amar e acolher eu sei.
E agradecer. Sou tão grata por ser acolhida. Durante muito mais da metade da minha vida me senti excluída. Era tímida demais. Não gostava de esportes, tinha muitos medos, era esquisita. Me achava incapaz.
Felizmente a poesia me pegou pelas mãos e me levou. É a minha pele, meu barco, minha estrela.
Essa edição tão cuidada e pequena quase não cabe em mim, de tão imensa.

 

sexta-feira, 20 de abril de 2018

O QUE NÃO TENHO PARA TE DAR

O que não tenho
para te dar:
os centauros
que galoparam
nos prados doloridos
da infância e que escaparam
para nunca mais,
os anos que já vivi,
as ruínas onde
me aninho às vezes
quando não sei decifrar
a esfinge na orla
do deserto,
os dons que nunca
me habitaram
e são como países
longínquos
que nunca verei,
o escaravelho dourado,
que te daria se pudesse,
mas não é meu.
Roseana Murray
Poema Inédito

quarta-feira, 18 de abril de 2018

DIA NACIONAL DO LIVRO INFANTIL

No Dia Nacional do Livro Infantil, o que tenho a dizer é muito simples.
Que bênção ter crianças como leitores.
As histórias maravilhosas que já vivi do contato das crianças com a minha poesia são o paraíso.
Quando o editor fica em dúvida se a criança entenderá o que escrevo, sem dúvida nenhuma ela entenderá.
Numa palestra do Saramago em que eu estava presente, ele disse que era a favor de que sempre se oferecesse à criança um pouco mais. Também penso assim. 
Comecei a escrever para as crianças por puro acaso, como já contei tantas vezes. Não foi uma decisão. Não pensei: Vou fazer literatura infantil.
Mas esse acaso iluminou a minha vida para sempre.
E continua iluminando.

terça-feira, 17 de abril de 2018

GENTE ESQUISITA

Quando li "Mulheres que correm com os Lobos" da Clarissa Pinkola Estes, na década de 90, fiquei muito impactada com muitas coisas.
Por exemplo: ela diz que os outros sabem quando você é uma pessoa autêntica, quando você é você. E sentem-se bem ao seu lado.
Em nosso Identidades: Atelier Poético Psinalítico, William Amorim leu um texto da Clarice Lispector onde ela fala maravilhosamente sobre o tema: Se eu fosse eu.
Acontece que é muito difícil ser o que se é mesmo.
Ê muito difícil que a tua fala, a tua vida e teu corpo estejam em sintonia, dizendo a mesma coisa.
Isso é um trabalho de anos. Clarice dizia mais ou menos isso ( não sei se alguém me contou ou se li em algum lugar):
Tem gente que costura para fora. Eu costuro para dentro.
De tanto costurar para dentro, sou apaixonada por pessoas que são elas mesmas. Que deixam sua singularidade aflorar. Sou apaixonada por gente que é meio fora da norma, do rebanho. Gente esquisita.
A Elvira Vigna sempre me dizia: - "Você é muito esquisita." Para mim era um elogio melhor do que se me dissesse: Você é tão doce, bonita, etc, etc.

segunda-feira, 16 de abril de 2018

TEMPO ESTRANHO

Vivemos um tempo estranho, tempo de ódio, onde as palavras viram facas ou pedras.
Um tempo de guerra. 
Não só verbal, pois as armas precisam ser vendidas e usadas. Afinal, o mercado de armas e drogas move o mundo. Então, seja aqui ou do outro lado do mundo, o sofrimento tinge manhãs, tardes e noites. Talvez se Gagárin visse hoje a Terra do alto, sua famosa frase mudasse de cor. Quem sabe diria " A Terra é vermelha", mas vermelha de sangue.
Desde a Segunda Guerra não se vê tanta gente deslocada.
Desde a Guerra Fria o perigo do uso de armas nucleares nunca foi tão presente.
Qual seria a saída? Há saída?
Talvez mergulhar no melhor do humano.
Resgatar esse melhor do humano submerso, escondido entre os ossos. O melhor em nós.
Esse é um longo trabalho. O trabalho de uma vida.

sexta-feira, 13 de abril de 2018

VISITA

Uma pessoa maravilhosa de Goiânia fez sua dissertação de Mestrado sobre a minha obra.
Porque o destino quis, eu a conheci, já que uma Faculdade de Pedagogia de Goiânia me chamou para falar. Eu avisei que não era acadêmica nem formada em Pedagogia.
Depois Gloria Kirinus, que publicou o magnífico Synthomas de Poesia, imprescindível para quem se preocupa com o tema, me deu licença poetica para falar apenas como poeta.
Pois bem, a pessoa que escreveu a dissertação, estava na plateia e foi amor ao primeiro encontro.
Ela fez um jantar maravilhoso, porque além de tudo o que faz, cozinha divinamente, convidou algumas pessoas especiais, entre elas a Gaby, uma freira mexicana absolutamente incrível.
Pois bem, Sônia Santos chega hoje na minha Casa Amarela. Nunca mais, desde aquele dia distante, perdemos o contato.
Amor é coisa séria.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

VOLTA

Volto para Saquarema depois de passar 10 dias em Mauá, depois de dar uma oficina no Instituto Estação das Letras no Rio de Janeiro, depois de visitar Paquetá, o que não fazia desde 1999.
Em Visconde de Mauá tive um encontro lindíssimo na Casa Beatles com umas 30 professoras. Falamos sobre a vida, sobre leitura, sobre poesia. O Atelier Identidades com William Amorim foi maravilhoso. Os dois encontros se entrelaçaram cheios de emoção.
Quando volto para casa, onde para usar uma imagem marítima, sinto como o meu barco mais estável, aqui tenho um escritório com mesa e computador, as correspondências transbordam, os pedidos de tantas coisas transbordam, os gatos me ignoram porque fiquei muito tempo longe.
Mas enfim, cheguei, tento colocar todos os pedidos em dia e me preparo para receber uma visita especial: Sonia Santos, de Goiânia.
Além de minha leitora, ela fez a dissertação de Mestrado sobre a minha obra. Eu a conheci pessoalmente e ela é adorável e agora me preparo para recebê-la.
Começo a pensar no próximo Atelier Poético-Psicanalítico sobre Intolerância, matéria farta em nossos dias, em nosso mundo, que deve acontecer em julho. Começo a me preparar para o lançamento do meu livro Poemas para Metrônomo e Vento, que acontecerá no Babel Restaurante, do meu filho André Murray, no dia 10 de maio.
Alguns amigos de longe irão ao lançamento. O Coral do Visconde deve cantar ( e meu filho Guga Murray compôs uma música para um poema) sob a batuta da Márcia Patrocínio. 
Para costurar tudo isso tenho a minha fábrica de poemas.
Hoje dizia para um amigo querido: poesia é dom e ofício.
Escrevo como respiro, mas escrevo sempre e isso ajuda na fabricação do poema, onde além de imagens e palavras entram tantas coisas, nossa alma, nossos desejos, nossa bagagem de vida, nossas estradas, nossos medos. 

segunda-feira, 2 de abril de 2018

Redes

Quando em 1997 fui com Juan Arias a Lanzarote fazer uma longa entrevista com Saramago, fomos recebidos por Pilar del Rio. Eu conhecia Pilar das dedicatórias de seus livros. E de repente ela era de carne, osso e amor.
No último dia Juan entrevistou Pilar. E ela disse: José escreve porque precisa ser amado.
Todos queremos ser amados . É o primeiro mandamento do humano.
Por isso queremos ser lidos, elogiados, vistos, compartilhados.
Que possamos estar em contato com milhares de pessoas ao redor do mundo ao mesmo tempo, é algo muito novo. Ainda é muito cedo para avaliarmos as consequencias, para o bem e para o mal. Já que todos sabemos que bem e mal caminham juntos.
Algumas coisas são do conhecimento de todos: a privacidade acabou, vivemos no tempo da construção de imagens. Já sabemos também que estamos inundados por notícias falsas e manipulações. Sabemos que "eles" , que não sei quem são, escolhem o que será veiculado. Começamos a saber que as "curtidas" podem ser compradas!
As redes sociais são uma extensão das nossas vidas, na palma da nossa mão, a um clique.
Para disseminar o bem e o mal.
Ser leitor é mais do que importante para sabermos como é que nos movimentamos nessa intrincada floresta.
Mais do que nunca a literatura é nosso anjo da guarda.