sexta-feira, 30 de abril de 2010

UM POR MINUTO

Da leitora Maria Neuza recebo o livro de seu filho Luís (nome do meu neto) Gustavo (nome do meu filho) Guadalupe Silveira, UM POR MINUTO. O livro de contos e crônicas é bem humorado, engraçado e passeia um olhar crítico e atento sobre o cotidiano. Maria Neuza me pede que leia algum conto no nosso próximo encontro do Clube de Leitura que será no dia 3 de julho. Prometo, Maria Neuza.

QUADRO NEGRO
Nenhum olhar curioso, só bocas abertas em bocejos. Não tem ninguém na sala. Nem o professor cansado, nem os alunos com seu tédio. À chamada, só os corpos estão presentes. Estão em casa, na praia, na boate, no bar... em todo ligar, menos na sala. Ninguém quer estar na sala. Não tem ninguém lá.
Luís Gustavo Guadalupe Silveira,
Casa do NovoAutor Editora

O texto é uma receita do que não se deve fazer em sala de aula.

Hoje cedinho fui caminhar com o Juan. Andamos para trás, em direção à lagoa. As ruas são quietas e lindas. Parece irreal, um sonho, uma miragem. Numa calçada há um lindo canteiro de flores com um grande aviso escrito à mão. Não tinha uma caneta para copiar, mas era mais ou menos assim: Pedimos que não arranquem as flores, pois elas foram plantadas com todo o carinho para alegrar a nossa calçada. Muito obrigada.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

IRMÃS RUSSAS OUTRA VEZ

Já contei aqui no blog a saga dos nossos sobrinhos Guillermo e Enka com a adoção de duas irmãs russas que vivem no Pólo Ártico. Pois bem, eles estão lá, enviaram fotos, as crianças são lindas, uma, a mais novinha, de dois anos, tem os olhinhos bem puxados. Elas estão separadas, a crueldade já começa aí. Eles corriam de uma casa para a outra para estar um pouco com cada uma. As crianças se apaixonaram perdidamente por eles, já dizem "pap"e "mam" e estão muito magrinhas, parece que quase não comem.
Foi um encontro tão forte que todos choramos com as cartas e fotos que nos enviaram. Agora, o normal depois de três anos de burocracia e muito dinheiro, seria que eles partissem com as meninas. Mas não, amanhã voltarão para a Espanha sozinhos, com o coração partido e o juiz só vai deliberar sobre o caso em agosto. Parece que ainda terão que voltar mais duas vezes até liberarem as filhas. Alguém já viu uma crueldade mais gratuita? Enquanto isso as crianças continuam lá, sabendo que já possuem um pai e uma mãe e uma casa, que poderão viver todos juntos, mas precisam esperar mais alguns meses. E por que ?

quarta-feira, 28 de abril de 2010

UM POEMA ESPECIAL

Minha irmã Evelyn Kligerman é escultora, ceramista e arte educadora. Tem um ateliê lindíssimo em Teresópolis na Cascata dos Amores. É uma grande, imensa leitora, uma devoradora de livros. Mas não é poeta. Ou melhor, é poeta de outras maneiras, com outros materiais.
Nós duas estamos vivendo juntas uma experiência difícil, triste, dura. Nossa mãezinha de 89 anos está morrendo. Lentamente, mas piora um pouco cada dia. Sua cabeça, entretanto, continua intacta e sua memória prodigiosa. O que nos deixa mais tristes ainda. É uma pena tão imensa que a doença a esteja devorando. Minha mãe foi uma artista e louca no seu tempo, sempre à frente da sua época. Ela nos deixa um legado maravilhoso de coragem, falta de preconceitos, bondade. Por uma coincidência incrível uma de suas grandes amigas de juventude reapareceu agora, justamente agora e escreveu uma carta linda falando dela e das suas idéias. Pois bem, Evelyn ontem descia a Cascata dos Amores para ir até a casa da nossa mãe no final da tarde e um poema inteiro se escreveu na sua mente:

Te dou três palavras
carne osso e alma
toco a carne
quando não há carne
toco os ossos
quando não houver mais
colarei tua alma na terra

Evelyn Kligerman

terça-feira, 27 de abril de 2010

CENAS DE RUA

Não resisto, preciso contar: hoje fui ao Centro de Saquarema , ao correio. Desci do ônibus com o livro Carta para Você , meu livro de rua, na bolsa. Na descida do ônibus tem um banco e esperei todos subirem no ônibus que seguia para Bacaxá, ficou apenas um casal de namorados bem abraçadinhos, então deixei o livro no canto do banco. Fui ao correio, demorei, voltei e ao passar pelo banco no caminho para o meu ponto, surpresa: o livro continuava no mesmo lugar!!!
E o banco estava cheio de gente! E o casal continuava aí, os dois namorados bem abraçadinhos.
Primeira hipótese: nenhum leitor passou pelo banco, pois um leitor teria aberto o livro e lido o bilhete que deixei. Um leitor não resistiria. Se chover e ninguém aparecer para pegar o livro será muito triste. Está ameaçando chuva e eu aqui torcendo para que alguém leve o livro para casa.
Segunda hipótese: acharam que alguém poderia ter esquecido o livro no banco e voltaria para pegar.

Cena esperando o ônibus de volta para casa na frente da lagoa: uma garça maravilhosamente branca numa pose esplêndida pousada sobre o azul. Dois cachorros absolutamente negros correm atrás da garça, ela voa para o meio da lagoa.
Um biguá, parece um patinho negro, nadando e à sua frente um cardume de peixinhos prateados pulando.
Um homem com uma carroça cheia de quinquilharias pára , estaciona a carroça e mergulha na água. Os cachorros que já haviam expulsado a garça mergulham junto com ele. Ele sai, se sacode como um cachorro e segue viagem.
No meu banco uma jovenzinha briga com o namorado pelo celular.
Chega o meu ônibus, não sei se houve uma reconciliação.

ÁFRICA DO SUL/BRASIL

Por tudo o que tenho visto, ouvido e lido sobre a África do Sul, as semelhanças com o Brasil são imensas. Começando pela beleza, a África do Sul, como o Brasil é um dos países mais estonteantes do mundo. Não vivemos o apartheid como foi conhecido na África do Sul, mas vivemos, até um passado muito recente,um apartheid disfarçado: os negros pelo elevador de serviço, da cozinha para trás da casa. Sem a hostilidade aberta da África do Sul, mas cada um no seu lugar. Não vejo hoje ainda uma classe média negra florescente no Brasil, não vejo médicos negros no Hospital Samaritano no Rio, são poucos negros ocupando postos importantes na nossa sociedade. Como na África do Sul o Brasil tem um índice de criminalidade altíssimo e o que podemos falar das nossas prisões, onde não há nenhuma preocupação em reeducar as pessoas, nenhuma tentativa de inseri-las outra vez na sociedade? Como na África do Sul temos uma diversidade cultural impressionante e a dança e a música são naturais, são como o ar que cada um respira. Como no Brasil a África do Sul tem bolsões de miséria , oceanos de miséria, onde nem a polícia entra. E a corrupção do partido do governo é imensa. A África do Sul ainda tem que quebrar resistências para que negros e brancos possam conviver em harmonia, mas tem conseguido avanços. No Brasil brancos e negros convivem em harmonia mas as distâncias econômicas são muito grandes. A saída, como sempre é simples: educação e leitura em igualdade de condições para todos, tanto lá quanto aqui. E claro, moradias dignas, saneamento, saúde, etc. O Brasil não viveu o regime brutal do apartheid, estamos melhores. Mas falta muito, muito mesmo para a gente ter um país mais digno e lá, na África do Sul, falta muito para se chegar ao sonho do Nelson Mandela.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

CARTA PARA VOCÊ

Pronto. Me cadastrei e cadastrei um livro no site www.livroderua.com.br. Imprimí uma etiqueta , colei no livro, mas não satisfeita escreví uma carta e grampeei na primeira página explicando que a pessoa que o encontrar deve se cadastrar também e depois passar o livro adiante. Vou "liberá-lo" no banco do ponto de ônibus de Saquarema, um lugar de algum movimento. Escolhí um livro muito interessante: Carta para Você. Dois jornalistas pediram a vários autores, entre eles, Martha Medeiros, Adriana Lisboa, Francine Prose, Margaret Arwood, para escrever cartas de amor imaginárias, em tempos de internet. O livro é ótimo e quem o encontrar vai gostar, com certeza. Gostaria de ter uma câmera filmando o momento do encontro. Mas consigo imaginá-lo.

Hoje uma leitora me escreve contando que depois de anos desejando ter uma Sala de Leitura em casa conseguiu arrumá-la. Teve que fazer uma revolução em casa, desalojar móveis, modificar ambientes, mas conseguiu. A sua felicidade era imensa.

Dizem os neurocientistas que devemos rir muito. Rir, dizem eles, afeta o cérebro de maneira muito positiva, espalha bem -estar por todo o corpo e afasta doenças.

domingo, 25 de abril de 2010

SAFO

Quando tinha quinze anos estudava no Instituto Lafayette na Tijuca, na Rua Hadock lobo, um casarão antigo impressionante. Fazia o clássico e tinha aula de História Antiga. Nosso professor falava baixinho e assim com sua voz macia nos trouxe o Egito, Grécia e Roma para bem perto. Ele nos apresentou a Safo, poeta grega por quem me apaixonei perdidamente e para sempre. Um poema,sobretudo, me queimou como fogo:

a lua já se pôs, as plêiades também;
é meia-noite;
a hora passa , e estou deitada sozinha.

Tudo o que Safo escreveu nos chegou através de outros. É uma longa história , mas que um poema tão antigo tenha atravessado quase três mil anos e respire ao meu lado como se fosse hoje, que sua voz chegue, viva, mesmo que através de citações, emociona muito.

Em 1991 fui a Campinas lançar meu livro Pássaros do Absurdo. Fiquei hospedada na casa da dona da livraria cujo nome infelizmente não lembro, pois ela foi uma anfitriã maravilhosa. O lançamento seria no dia seguinte. Em sua livraria me deparei com o livro Eros, Tecelão de Mitos , A Poesia de Safo de Lesbos, de Joaquim Brasil Fontes, ed. estação Liberdade. Eu já havia namorado o livro antes numa livraria na Tijuca, mas era caro, eu não podia comprar. À noite fomos jantar com um amigo da minha anfitriã. E a surpresa: ele era o Joaquim Brasil Fontes. Ela me disse: ele é o autor do livro que você ficou namorando. Disse para ele o poema acima que sabia desde a aula de história e ele me disse o poema em grego. E me deu o livro autografado. Meu lançamento foi um fracasso total, não foi quase ninguém. Mas o Joaquim disse que havia lido meu livro e que eu era uma boa poeta... A viagem de volta, de ônibus, foi curta para tanta felicidade e seu livro está gasto de tão lido.

sábado, 24 de abril de 2010

CONVITES

Recebo muitos convites para estar em muitos lugares e aceito o que posso. Dia 10 de maio vou a Brasília e dia 30 vou a Teresina. Entre as duas datas vou a Resende dar uma oficina de poesia e gastronomia com professores de Itatiaia junto com meu filho André e tenho que ir a Teresópolis para estar um pouco com a minha mãe. Mas hoje um convite me deixou com água na boca: um evento em Matosinhos, em M.G, Poesia na Praça, onde falam meus poemas. Pelo carinho da professora Jane que me escreveu eu já estaria lá. Também adoro o nome da cidade.Mas infelizmente sou apenas uma pessoa com um corpo dolorido e não poderei ir. Todos os convites me deixam extremamente lisonjeada.

Hoje o sábado está meio para fotografia em preto e branco, o mar violento, um certo sudoeste.

Leio no Prosa e Verso que o livro Léxico Familiar de Nathalia Gisnburg está sendo relançado. O livro é maravilhoso , vale a pena. A autora refaz o cotidiano, a vida da família na Itália fascista, através das expressões que usam. Uma delícia. Toda família utiliza expressões que lhe são próprias e reconhecidas pelos membros do clã. Experimente selecionar algumas da sua própria família.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

BUTÃO

Ontem assisti pela televisão alemã a um programa lindíssimo sobre o Butão, país budista aos pés do Himalaia. O Butão possui o aeroporto mais perigoso do mundo e pelo que entendí o número de turistas é controlado. Estávamos na coroação do Rei, uma festa impressionante, colorida sobretudo. O Butão se diferencia de todos os países da face da Terra porque mede o Índice de Felicidade, o FIB e não o PIB. Pois eles pregam que bens materiais não necessariamente produzem felicidade.Uma vida simples mas plena e harmoniosa é que produz felicidade e sentido. Nada a ver com a nossa sociedade de consumo voraz e destruidora.
E por coincidência , leio hoje que a quantidade de lixo que deixam no Himalaia é impressionante. Como nós, animais humanos produzimos lixo e sujamos tudo, por onde passamos deixamos um rastro de imundície e destruição. Mesmo os que escalam o Himalaia não se intimidam. E isso é muito triste. Que o Butão nos ajude a pensar na verdadeira felicidade, na pequena felicidade, a de todos os dias, quando acordar já é um milagre.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

LIVRO DE RUA

Hoje leio no O GLOBO sobre o Projeto Livro de Rua que já conhecia de longe, de ouvir falar, mas na França e agora o Projeto está no Brasil. O projeto é inspirado no movimento internacional Book-Crossing. É uma iniciativa do Instituto Ciclos do Brasil. É uma corrente, você coloca um livro num lugar público , alguém apanha, lê e passa adiante, fazendo a mesma coisa. É importante cadastrar o livro no site wwwlivroderua.com.br, se coloca o número da inscrição na capa e o local onde foi deixado. Vou conversar com a Secretaria de Educação de Saquarema para ver se a gente executa o projeto aqui e sugiro que cada um se informe para fazer o mesmo no seu bairro, conectando-se com a Biblioteca mais próxima. Estou sempre doando livros, pois não acho que meus livros tenham que ficar aprisionados numa estante. Fico apenas com os que vou reler algum dia e com os livros de poesia que a gente está sempre relendo. Ainda bem que recebemos muitos livros da Espanha, é uma sorte imensa. Falando em livros em espanhol o Brasil já possui uma lei que torna obrigatório o ensino do espanhol nas escolas mas ninguém ouve falar nisso. Se pensarmos que as crianças e jovens aprendem uma lingua com uma facilidade impressionante fico pasma quando constato que nenhuma criança sai falando lingua nenhuma quando termina todo o fundamental. E o Brasil é cercado de países que falam espanhol por todos os lados. e o espanhol é uma lingua irmã, tão fácil e tão maravilhosa!!! Que dádiva imensa é possuir uma lingua além da nossa. Lembro do filósofo Fernando Savater dizendo que a diferença entre um rico e um pobre é a quantidade de palavras que cada um possui.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

ENTREVISTA

Uma escola me envia perguntas dos alunos. "Qual foi o seu primeiro poema?" "Como era o nome do seu poema predileto quando era criança?" Falo a verdade : não sei. O meu primeiro poema não foi um marco ou uma linha divisória. Fui escrevendo desde muito cedo com uma interrupção de dez anos quando não escreví nem uma linha e aos 27 anos contos muito curtos foram virando poemas. Eram horríveis, ainda bem que não guardei nenhum. O meu poema preferido na infância era sobre um jantar de família onde uma menina a cada momento pedia para falar alguma coisa e não deixavam. Quando termina o jantar o pai autoriza a filha a falar e então ela responde que já não adianta, pois ele já havia comido a lagarta que estava na salada. Não lembro nem do poema, nem do título nem do autor ou autora, mas eu o amava. Aprendi de cor na aula de declamação que fazia no Clube Monte Sinai quando tinha uns 10 anos. A escola me respondeu que ficou muito decepcionada comigo! Não era o que ela esperava...

Leio a poeta argentina Alejandra Pizarnik, pois ganhei de presente sua Poesia Completa.
É uma verdadeira maravilha. Ouçam:

DEL OTRO LADO

Como um reloj de arena cae la música en la música.
Estoy triste en la noche de colmillos de lobo.
Cae la música en la música como mi voz en mis voces.

terça-feira, 20 de abril de 2010

FLORES NA ÁFRICA

Parece que voltamos aos primórdios do século XX. Navios e trens ao invés dos aviões. Atrás de cada passageiro impedido de voar há uma história, há todo o desespero de se sentir aprisionado numa teia. Por exemplo, nossos sobrinhos Guillermo e Enka que tinham voo para Moscou de Granada no dia 26, para conhecer as duas futuras filhas, as irmãzinhas russas, talvez tenham que ir de carro: do sul da Espanha até o Círculo polar Ártico é muito longe.
Mas o que mais me comove são as flores da África. Não podem embarcar e apodrecem nos aeroportos. Muitos empregados africanos, que cuidavam do embarque das flores, estão sendo despedidos e não poderão pagar seus aluguéis, comer, comprar remédios.
Não estamos no começo do século XX. Hoje o mundo inteiro está interligado. Pessoas moram num país e trabalham em outro. O tempo mudou e o espaço também. É uma história estranha e inesperada e de longe acompanhamos os humores do vulcão na Islândia. O centro da terra, normalmente invisível, hoje afeta a vida de muitos habitantes do nosso planeta.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

ARABESCOS E LATUF

Estava em Teresópolis este final de semana quando recebo uma resenha sobre meu livro Arabescos no Vento . Latuf, meu grande amigo , sábio , louco e erudito, foi convidado para escrever para a Revista Colóquio das Letras de Portugal e fui objeto da sua linda crônica . Fiquei emocionada, é maravilhoso encontrar um leitor que varra a nossa obra com um olhar tão amoroso.
Latuf ,cujas raízes estão no Líbano, foi convidado para um encontro com o Presidente do Líbano na próxima semana. É uma honra para todos: para o Presidente, para o Líbano, para seus amigos, para seus alunos, para Saquarema. Ele foi escolhido por ser um descendente ilustre deste belo e sofrido país.

Juan Arias, meu marido, é o mais novo membro da Fundação Santillana. Estou rodeada de gente ilustre!!!!!

Recuperei meu livro perdido Marcovaldo do Italo Calvino, numa nova edição belíssima da Cia das Letras. É um dos meus livros mais queridos, sou apaixonada.

sábado, 17 de abril de 2010

CEBRIÁN

Hoje, na última página do Prosa e Verso há uma entrevista com Juan Luis Cebrián, onde fala do seu livro de ensaios O Pianista no Bordel. Juan Luis foi o fundador do El País e em sua entrevista nos diz: os jornais como os conhecemos estão acabando. Não se pode levar o jornal em seu formato papel, tal como existe, para a web. Na rede, a informação é outra coisa.É um jogo de espelhos, uma reverberação que chega ao infinito, uma matéria se abre em outra, em filmes, em milhares de fotos, nos leva a leitores jornalistas, leitores fotógrafos, ela muda a cada instante, se atualiza, não é estática. E Cebrián nos diz: tudo vai mudar, mas não sabemos como, ele nos diz que não tem as respostas e nem mesmo as perguntas. Mas o jornal de papel já nasce todos os dias obsoleto. E estamos vivendo uma mudança de civilização.

No entanto, como é difícil imaginar o café da manhã sem o jornal ao lado, sem o toque do papel nas mãos, sem o prazer indizível de ler a coluna que amamos, eu por exemplo, espero a semana inteira a crônica do José Castello. Para mim, a tela ainda é fria, preciso de um contato corporal com o que estou lendo. Preciso das mãos tocando o papel como se tocasse um corpo, uma pele. Mas sei que tudo o que conhecemos está por um triz .

quinta-feira, 15 de abril de 2010

DE GOVERNADOR VALADARES

Hoje recebo uma mensagem de um amigo da década de 80. Nunca mais nos vimos, mas tenho um compartimento especial, um cofre, onde guardo todos os amigos de todas as épocas. Arnoldo de Souza vivia no Rio , era médico e poeta, fizemos oficina de poesia na Olac e no final dos anos 80 ele foi para Governador Valadares. Nunca mais nos encontramos, mas imagino que além de exercer a medicina ,ele continue a escrever poesia. Graças ao Google pude encontrar seu e-mail , pedi seu endereço e enviei meu último livro Carteira de Identidade. Queria que alguém daquela turma que cresceu em poesia comigo , visse meu último trabalho. Fiquei muito feliz com o que ele escreveu sobre meu livro. Lembro de cada um, por onde andarão todos? Nesta época não havia internet e sobrevivíamos!!! Depois da Olac chegamos a fazer um grupo de poetas, os Ladrões do Fogo e publicamos um pequeno livro, uma amostra do que cada um escrevia. Mas realmente cada um virou a sua esquina e desapareceu. Escolhi o Arnoldo em nome de todos estes amigos.

"Olá Roseana,
Parabéns, seu livro chegou, belissimo, em todos os sentidos, denso, suave, em vc a poesia é cármica, carregada de mensagens ancestrais e com a palavra sempre enxuta sopesada, sem desperdícios, poesia- síntese, fluente de uma emoção extravasada. Belas tb as ilustraçoes ,parabenize a Elvira, pois elas acompanham o texto em sua leveza ,sinuosidade, e simplicidade sintética, com imagens em ação permanente. Emocionante, em uma palavra eu digo sobre seu livro, já aguardo o próximo, e sei que ele virá também belo e fácil de indentificar sua autoria como esse RG com que voce nos brinda, sua nudez digital em fomra de metáforas; um tsunami poético a nos abalar tirando-nos do conforto da vida mediana."

Meu grande amigo Latuf falou ontem no Instituto Cervantes do R.J sobre a linguagem dos blogs. Latuf é um erudito e gostaria de ter estado na platéia pois ele leu o twitter-conto que escrevi para o artigo que Juan Arias fez para seu jornal El País falando sobre o concurso da Academia Brasileira de Letras. Não enviei o conto para o concurso, pois não tenho twitter e era muito trabalho. Também é muito discutível se 140 caracteres fazem um conto. Diz meu amigo Latuf que até um suspiro faz um conto...

quarta-feira, 14 de abril de 2010

MENINAS RUSSAS

Nossos sobrinhos Guillermo e Enka, que vivem em Granada, entraram num programa de adoção de crianças russas. Já são três anos de grande expectativa. Agora, finalmente irão ao Distrito de Nenetsia, até a cidade de Narjamar no norte da Rússia Européia, às margens do Oceano Ártico, no Círculo Polar Ártico. Estão com sorte, pois agora, quando finalmente irão conhecer as duas meninas russas, faz apenas 15 graus abaixo de zero. No inverno são menos 50. Duas meninas russas, uma de 3 anos e outra de 5, no futuro serão andaluzas. Como será para elas chegar em Granada, com seu esplêndido céu azul? No verão a temperatura em Granada pode chegar a 45 graus, positivos! Grande expectativa cerca a chegada das duas meninas. Mas eles não poderão trazê-las imediatamente. Apenas na terceira viagem . Abomino toda a burocracia do mundo! Depois de três anos , será que os russos já não sabem o suficiente sobre Guillermo e Enka? Por que precisam ir até o Círculo Polar Artico tantas vezes para que liberem as futuras filhas? Imagino quatro corações pulsando juntos, de amor e ansiedade. Quando eu for a Granada em setembro para ver meu netinho Luis conhecerei as meninas russas. Até lá já estarão falando alguma coisa em espanhol, imagino. Crianças aprendem rápido uma nova lingua. Já estarão com seus novos amigos, novos primos, todo o frio ártico do abandono será deixado para trás.

terça-feira, 13 de abril de 2010

MANOEL DE BARROS

O nosso maravilhoso poeta Manoel de Barros lança um livro inédito e sua "Poesia Completa" aos 93 anos. Manoel de Barros é mesmo um poeta árvore, cada vez mais frondoso .

O Caderno Prosa e Verso ganha uma página nova : risco , um espaço novo para a poesia.

Fico sabendo que hoje é o Dia do Beijo. Mas todo dia não é dia de beijo? Bom, fica a dica: beije quem você ama, mãe, pai, filho, cachorro, gato, namorado, etc... O beijo libera endorfina e faz a gente mais feliz.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

PERGUNTAS

Kira, nossa netinha que vive em Barcelona tem 4 anos e meio e entrou na era das perguntas. Agora ela quer saber como se faz um cavalo e como se faz um garfo. Kira, que virou livro, está no Catálogo de Bolonha.

Segunda-feira. Acho uma maravilha os nossos dias da semana tão diferentes das outras linguas. Não existe uma primeira feira , já entramos na segunda, mas temos cinco, não podemos nos queixar. As feiras são festas . Quando era criança o dia de feira era esperado ansiosamente. Eunice, nossa segunda mãe, me levava sempre. Ela conhecia todo mundo e de cada barraca conseguia algo para mim. O melhor era o quebra-queixo, um doce puxa-puxa que me levava até o céu. Estávamos na década de cinquenta e Eunice usava uns vestidos apertadíssimos rabos de peixe e fazia muito sucesso por onde passava. Eu a amava. Eunice tinha um filho que morava com uma senhora no alto de uma favela. Toda semana subíamos o morro e passávamos a tarde aí. A senhora tinha duas filhas muito bonitas da minha idade.Não havia tráfico de drogas e brincávamos livremente. A cidade da minha infância não existe mais. Cinquenta anos se passaram. As favelas, de lugares pacíficos viraram espaços dominados pelo medo. Mas as favelas em cinquenta anos não deveriam ter se transformado em lindos bairros populares? Com casas dignas, ruas arborizadas,praças, espaços de lazer...

domingo, 11 de abril de 2010

CLUBE DE LEITURA DA CASA AMARELA

Fiquei alguns dias sem internet. Não tinha o telefone dos 18 professores inscritos para para o nosso primeiro encontro do Clube de Leitura. A Secretaria de Educação queria adiar , mas eu pensei que se alguém, apesar de todas as dificuldades , viesse até a minha casa, seria horrível ter a porta fechada. Então mantive o encontro. Preparei o almoço, fiz pão, sobremesa, arrumei a mesa, os vinhos e ... vieram apenas 3 professoras e um professor, além da Secretaria . mas apesar de sermos tão poucos, foi tudo lindo. Estivemos felizes discutindo o livro O Leitor: sua escrita seca e limpa, a Alemanha pós guerra e todas as questões da culpa, do perdão , da obsessão e do analfabetismo de Hanna. Falamos da importância da desobediência, falamos das escolas, dos sonhos. Foi um começo. Uma poeta minha leitora, Hellenice Ferreira, enviou seu livro Poemar para ser distribuído. Todos ficaram animados em fazer um Clube de Leitura em suas escolas junto com a comunidade. E o próximo encontro será dia 3 de julho e o livro escolhido é Quase Memória, do Carlos Heitor Cony, uma obra prima. Esperamos para a ocasião uma semana calma, um dia magnífico. Agora temos que acreditar que as tragédias acabaram.

A editora Manati me deu a notícia de que uma editora polonesa está interessada no meu livro Jardins com o Roger Mello. E espero que a internet não caia outra vez, fico desamparada sem os meus leitores, fico frágil.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

TRAGÉDIA

Ontem quando escrevia no blog não fazia a menor idéia do que estava acontecendo aqui mesmo em Saquarema e no Rio de janeiro. Sabia apenas que havia chovido torrencialmente durante a noite e em cima da cama do quarto de hóspedes. Assim que acabei de escrever caiu a internet. Quando minha irmã me ligou , a tragédia entrou pelos poros da casa. Saquarema também está um caos, dizem, porque eu não saí de casa. Um pedaço do cemitério caiu , a estrada para o Rio está interditada, etc. O que dizer diante de tanta dor, de tantos mortos?

terça-feira, 6 de abril de 2010

QUAL A PALAVRA?

Em 1994 estive em Sevilha no Congresso do I.B.B.Y para receber o diploma da Lista de Honra. Eu não sabia, mas esta viagem mudaria a minha vida, pois conheci o jornalista espanhol Juan Arias, nos apaixonamos , ele veio para o Brasil, nos casamos. Houve na chegada um almoço de confraternização. Eu me aproximei, depois do almoço, de uma editora de Israel e lhe ofereci um livro que fala sobre a paz: Qual a Palavra? Ela me perguntou se eu podia traduzi-lo rapidamente para que ela o lesse. Eu ofereci a tradução em francês e ela aceitou. Traduzi o texto e o Lino de Albergaria, que havia morado anos em Paris revisou a tradução. Entreguei o texto. Meses depois, no meu apartamento no Rio de Janeiro, recebi a resposta: o meu livro era lindo, mas infelizmente em Israel já se publicava muitos livros sobre a paz. Ela recusava. Agora estou rescindindo o contrato e busco uma editora para ele. Continua atual, como se o tivesse escrito ontem. Nada mudou no mundo desde aquele longínquo dia em Sevilha.

Chove sem parar. A chuva inundou a cama do quarto de hóspedes. Ainda bem que não tínhamos visitas! O mar está negro, furioso e belo. Gosto do mar selvagem. E ontem, vi o arco íris mais bonito do universo. Pousado no horizonte e o mar estava completamente dourado. Aqui não preciso escrever poemas, eles se escrevem sozinhos.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

EMPATIA

Os animais também sentem empatia. Também consolam com toques e abraços aqueles do seu grupo que estão tristes ou sofreram uma perda. A solidariedade faz parte do mesmo sentimento. Isso tudo já sabíamos mas os cientistas agora provam, tudo se processa numa área específica do cérebro como em nós, animais humanos. Além disso tenho certeza de que os animais pensam, elaboram. Isso ainda não provaram. Mas chegará o dia. Então somos todos variações de um mesmo tema. Em alguma camada profunda do meu ser me sinto borboleta de asas azuis e cintilantes, ou elefante, pesado, reflexivo, filósofo. Depende do momento e do tempo.

domingo, 4 de abril de 2010

OFICINA DE POESIA

Em 1984 fiz uma oficina de poesia na OLAC, com o Antonio Carlos Sechin. Foi um divisor de águas na minha vida, um momento luminoso onde realmente me aceitei como poeta, a palavra como ofício-vida. Sechin era alegre, bem humorado, muito generoso. Durante aquele ano escrevi meu primeiro livro de poesia para adultos, Viagens e Sechin, em seu apartamento, revisou o livro inteiro comigo. Em outra ocasião ele me disse: a tua poesia é bela. Nunca mais nos vimos mas guardo um carinho imenso por ele e não sei se ele se lembra daquela jovem tímida e amedrontada. Lembro de cada um do grupo, de cada encontro. Perdi o contato com todos. São as marés da vida que trazem e levam pessoas.

Hoje bem cedinho fui até a beira do mar. Passarinhos brancos em revoada se confundiam com a espuma. Um poema em azul e branco.

sábado, 3 de abril de 2010

O PEQUENO TRAIDOR

Revejo o filme O Pequeno Traidor da diretora Lynn Roth baseado no livro A Pantera no Porão de Amoz Oz. Na véspera da declaração do Estado de Israel o filme conta a amizade de um menino com um oficial inglês das tropas de ocupação. Antes da guerra o menino transita por uma Jerusalém sem fronteiras e quando o inglês lhe diz que no futuro o problema serão os árabes e não os ingleses, o garoto se espanta: os árabes? por que? pois se no mercado os árabes são seus amigos! Mas o oficial retruca : porque então os israelenses serão os fortes e os árabes os fracos.
O filme é lindo e nos faz pensar em como teria sido diferente se os dois Estados tivessem existido juntos desde o começo.


Eu, Juan e Latuf fomos jantar ontem no sítio dos amigos Hélio e Fernando. Saquarema tem uma área rural belíssima e não é preciso viajar para se estar no campo, basta passar a Ponte do Jirau e pronto. É como virar uma esquina e parar num outro país. Ontem a lingua falada era a da amizade, das corujas, da lua.

Meu irmão Israel kligerman me telefona. Nos vemos tão pouco mas eu o amo tanto. Trocamos informações sobre filmes e livros e o não sentido da vida. O que nos salva é o amor , a amizade.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

JESUS

Hoje é Sexta-Feira da Paixão. Até conhecer Juan Arias, meu marido, que é teólogo além de escritor e jornalista, Jesus sempre passou ao largo da minha vida, pois sou judia e Jesus sempre foi uma figura problemática para os judeus, já que ao longo da história fomos acusados de matar Cristo e por conta disso milhares de pessoas foram assassinadas. Mas Juan me trouxe uma figura muito bonita de Jesus, um visionário que pregava a não violência. Como conciliar Jesus com a Igreja Católica que ele não fundou mas que fundaram em seu nome? Como justificar as mortes , as perseguições, a intolerância, quando Jesus era um homem sem preconceitos que vivia cercado de mulheres, mendigos, leprosos, desvalidos? Como justificar o horror que a Igreja Católica devota ao sexo e ao mesmo tempo como soube esconder os crimes de pedofilia! O que diria Jesus de tudo isso? Hoje todos os católicos do mundo deveriam pensar em Jesus como um homem além do seu tempo, que pregava o amor e não a vingança, que pregava a paz e a alegria. E a Igreja deveria aproveitar os segredos malditos que escapam agora dos seus cofres para abrir todas as portas e as janelas e recriar uma Igreja realmente inspirada em Jesus.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

RISOS

Os neurocientistas provam o que todos já sabíamos: os animais também riem e o riso libera uma substância que age como antidepressivo. Quem tem um cachorro ou um gato sabe disso. Os macacos provocam o riso deliberadamente para aliviar tensões.Até os ratos riem!

Tão bom quanto rir é abraçar. Encostar nosso coração no outro para que ele saiba que somos frágeis como ele, tão humanos e mortais.

E amar. Cada pedaço de vida.