terça-feira, 5 de julho de 2016

PALAVRAS

Alguém já namorou uma palavra, assim de se apaixonar, de colocar na boca e sentir seu gosto misterioso, colocar no corpo feito perfuma raro?
Poetas são pessoas que se apaixonam por palavras, querem se casar com elas e as convidam para dançar no poema.E para isso o poeta tem que projetar o Salão de Dança, isto é, o poema, mesmo sem ser arquiteto, ou sendo apenas, arquiteto de nuvens e espaços siderais.
As palavras são a música do poeta, cada palavra tem, além do som, mil esconderijos. E é com elas que os poetas fabricam imagens.
Poetas são caçadores de palavras.
A prova disso? O belo poema do Drummond:

O LICOREIRO

O gosto do licor começa na idéia
licoreiro.
Digo baixinho: licoreiro.
Que sabor no som, no conhecimento do cristal
independente de licor-de-leite,
fabricação mui fina da cidade,
segredo da família de Oscarlina.

O licoreiro, vejo-o
delicioso em si, mesmo vazio
à espera de licor, de tal maneira
na forma trabalhada
habita o gosto perfumado
e em cada prisma-luz, se distribui
ao paladar da vista já gozando.

_ Que tem esse menino, a contemplar
o tempo  todo o licoreiro
se dentro dele não há nada?
Meu Deus, esse menino é viciado,
está na pua, só de olhar o licoreiro!

Carlos Drummond  de Andrade. Boitempo.

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