quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

SOBRE O POEMA

Diz Neruda em "Confesso que vivi" que o poema é como um pão ou uma cerâmica. Acho isso lindíssimo, o poema que nos alimenta, o poema que perdura dentro da gente. Tanto o pão quanto a cerâmica precisam ser amassados com as mãos. O corpo participa da feitura do poema, do pão e da cerâmica. 

Diz Octavio Paz, no belo livro " A duas vozes", que "o poema promove a intensificação da experiência presente, é uma imersão em camadas mais profundas da temporalidade, nas quais já não há mais a distinção entre o passado, o presente e o futuro." Então, dentro do poema o tempo simplesmente É.Sem divisões. A experiência poética nos leva a um mergulho para dentro de nós mesmos e para dentro do tempo.

Eu tinha uma amiga camponesa em Mauá na minha juventude. Ela tinha a idade da minha mãe. Quando saiu meu livro Fruta no Ponto, levei para ela ver as imagens, ela não sabia ler. Sua cozinha tinha um lindo fogão a lenha mineiro sempre aceso e dois bancos toscos, isso era tudo. Seu marido estava sentado num dos bancos perto da janela enrolando um cigarro com fumo de rolo, a cabeça baixa, na nossa frente, do outro lado da cozinha. D. Maria me pediu para ler o livro em voz alta. Li todos os poemas enquanto o fogo crepitava. Quando terminei, S. Elói se levantou e começou a gesticular e falar e tocava o coração querendo dizer a sua grande emoção e quase não conseguia. Era um homem rude, de mãos calosas e sempre sujas de terra. E ali experimentou algo que nunca havia sentido.

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