terça-feira, 18 de março de 2014

BUAKÊ

Para terminar meu relato sobre a África:

Françoise era a melhor amiga da minha irmã. Era tão delicada que quando estávamos juntas e ela precisava falar com alguém na sua língua, nos pedia licença e depois traduzia.Não sei quantas línguas falam na Costa do Marfim, são muitas.Mas há uma língua comum a todos, a do mercado e se chama djula.
Françoise nos convidou para passar o Natal em Buakê, onde morava seu pai. Fomos de trem .Um trem super lotado, com um calor de uns 60 graus! Muitas linguas, gente que viajava para suas aldeias. Na casa da Françoise não comemoravam o Natal.
Em sua casa tudo acontecia no quintal e seu pai tinha duas mulheres, , muitos filhos, muitos sobrinhos e sobrinhas e ele era o rei. Estalava os dedos e saía um prato de bananas fritas, outro de peixe frito...
 Buakê era uma cidade verdadeiramente africana, não se via brancos. Mulheres costuravam na frente das casas com os seios de fora. As crianças saiam correndo atrás da gente gritando em sua língua (esqueci a palavra, mas poderia ser algo parecido com tubabú): Brancas, brancas! Eu nem me lembrava mais que era branca . Fomos tratadas como rainhas, assim são tratados os visitantes na África. Ganhei um presente lindo do seu pai, um abridor de garrafas de bronze com a cabeça de um homem. Fomos ao mercado e compramos um colar para Françoise. Françoise pechinchava  (é ponto de honra nos mercados). Ela dizia: _ Elas são brancas, mas são minhas irmãs.
Fomos convidadas por uma amiga da Françoise para um café da manhã. A mãe da amiga era tão velha que parecia uma árvore de 100 anos. Com os seios de fora , coberta de colares e de amuletos, nos fazia tantos agrados, nos benzia sorrindo. Ainda posso vê-la 30 anos depois. Evelyn, que já havia avisado que era vegetariana comeu pão com manteiga e café com leite, como eu não havia falado nada , tive que comer um prato fumegante de carneiro com batata às 7 horas da manhã! Não se pode não comer o que é oferecido, é uma grande ofensa. Quando eu dizia para a Evelyn, minha irmã, em português, "não gostei", ela respondia em português, "cala a boca e engole".
Tivemos o privilégio de entrar na África negra, fomos a lugares onde nenhum branco podia colocar os pés.
Fiz muitas viagens na minha vida, nenhuma mais impactante. Levo a África no coração, e tenho tanta dor por todas as guerras, por toda a fome, por toda a pobreza, a doença. Os colonizadores destroçaram a África dividindo o continente de uma maneira artificial. Etnias inimigas tiveram que viver juntas no mesmo país. O mundo deve tudo a África, não deveria abandoná-la..

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