sexta-feira, 4 de maio de 2012

SILÊNCIO

Ontem assisti na TV 5 a um filme sobre a vida de Jorge Semprún, escritor que morreu no ano passado já com quase 90 anos. Espanhol Semprún chegou até as minhas mãos, meus olhos, meu coração, não sei como. Nunca sei como os livros aparecem magicamente na minha vida, a não ser os que busco. Ele foi prisioneiro de Buchenwald e do seu livro A Escritura ou a Vida, guardei duas passagens que me marcaram. Semprún era prisioneiro político e falava alemão. Não era judeu, era comunista. Ao entrar no Campo, ao dizer a sua profissão, declarou: estudante de filosofia. O alemão que anotava seus dados, também comunista e preso político lhe respondeu: isso não é uma profissão. Não vai servir aqui dentro. Ele insistiu. Sou estudante de filosofia e nada mais. O homem ficou em silêncio e datilografou. Trinta ou quarenta anos mais tarde, ele voltou a Buchenwald com os netos e uma equipe de televisão. A sua ficha de entrada foi resgatada. E no espaço reservado para profissão estava escrito: estucador. Uma palavra salvou a sua vida. A bondade anônima existe.
A outra passagem é belíssima. Semprún encontra seu professor de filosofia da Sorbonne no Campo, como ele preso político. Um dia seu professor contraiu tifo ou cólera, não lembro. Ele morria . Semprún estava ao seu lado. E como era ateu não podia dizer uma oração. Então recitou baixinho um poema de Baudelaire. Seu professor esboçou um sorriso e morreu. A poesia como oração.
Semprún demorou 30 anos para escrever seu livro. Um silêncio de 30 anos. Porque , diz ele, para viver precisava esquecer. Era uma escolha. Mas então , um dia, ele disse: a escrita E a vida.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário