segunda-feira, 26 de maio de 2014

VELHOS E VELHAS

Gosto de ver as velhas e os velhos nas praças. Elas, arrumadíssimas, com o bom gosto italiano e eles também. Gosto de vê-los subindo e descendo as intermináveis escadas, às vezes com a ajuda de uma bengala, mas sem desistir. Seu exemplo me deu tanta força que caminho horas sem me deixar vencer pela coluna que dói. Velhas bem velhas trabalham nas lojas na Veneza de dentro. Sentam nos restaurantes sozinhas e sozinhos. Às vezes andam em grupos de amigos e amigas conversando.
Falar a palavra velho ficou proibido.Mas eu acho a palavra linda. Uma pessoa velha é a que já viveu muito e acumulou experiência, sabedoria e se for leitora, está cheia de livros por dentro. Os velhos e velhas de Veneza não moram numa cidade fácil. Há que domar distâncias e escadarias. Imagino que os prédios antigos não tenham elevadores. Os supermercados não entregam as compras em casa. Aqui os velhos precisam ser auto suficientes para sobreviver.
Tenho 63 anos e se tiver sorte quero ficar bem velha como uma bela árvore velha. Quero que meus filhos, netos e amigos encontrem sombra e histórias ao meu lado. Não tento disfarçar a minha idade, é um privilégio viver. Sou testemunha de um tempo que já não existe e isso não se compra. Tenho lucidez para tentar entender o tempo complicadíssimo em que vivo e que ainda é o meu tempo.
Ontem caminhávamos por dentro de Rialto e paramos olhando para um lado e outro para decidir se íamos para a esquerda ou direita. Uma velha parou e nos perguntou se estávamos perdidos. Respondemos que adorávamos estar perdidos. Ela riu e falou: isso é maravilhoso, é assim que se deve viajar.
Ainda não sabemos por onde vamos nos perder hoje. Abro as janelas e vejo que choveu um pouco à noite e refrescou. Um absurdo o calor que fez até agora e em maio!
Ontem, dentro de Rialto encontramos um restaurante maravilhoso, o Vecio Fritolin da Irina. A Irina estava lá e nos atendeu de um jeito bem carinhoso e enquanto comíamos chegaram uns japoneses de uma revista para fazer uma reportagem. O Chef, que havia trabalhado no Japão, apareceu e explicava os pratos que eram fotografados. Tudo quase em silêncio , com muita delicadeza. A comida era tão boa que antes de ir embora dei um beijo em Irina.

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